Título: Futuro Autora: Claudia Modell Sinopse: Os pensamentos de Fox e Samantha na noite do desaparecimento dela. E-mail: claudia@subsolo.org Categoria: Pré-XF Homepage: http://subsolo.org Disclaimer: Os personagens dessa história foram criados por Chris Carter, 1013 e Fox Company. Futuro Cena 1 - Samantha -Fox??? Isso só pode ser uma brincadeira dele. Mas como ele fez isso? Como ele fez a luz aparecer na janela? Como ele fez com que eu me levantasse do chão daquele jeito? Aqui faz frio. Eu queria saber onde é aqui. Ou o que é aqui. -Fox!! Por favor!! Eu grito e grito, mas não ouço nada. Chego a duvidar que esteja escutando meus próprios gritos. Aqui é escuro. E frio. A luz que veio da janela já não existe mais. E nem mesmo uma janela existe mais. Eu não estou em casa, disso estou segura. E sei que meu irmão também não está aqui. Mas não consigo pensar em mais nada, alem de gritar o nome dele. Será que eu estou só dormindo? Eu me lembro de ter sonhado uma vez que tinha caído em um buraco. E o sonho era tão real... Mas naquele sonho eu chamei minha mãe, e de repente me vi face a face com ela, seu sorriso doce me consolando, dizendo que tinha sido somente um pesadelo. Eu deveria chamar por ela agora. Eu sei que deveria chamar por ela. Mas eu não consigo. Eu tenho medo de que se chamar por ela e isso não for um pesadelo eu nunca mais irei voltar. Então eu chamo pelo meu irmão. Ele cuida de mim sempre, eu sei que ele vem me buscar. Mas e se ele não souber onde eu estou?? -FOX!!! Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxx xxxx Cena 2 - Fox Ela foi embora. Eu vi a luz na janela. Eu vi ela indo em direção a luz flutuando. Eu não fiz nada. E ela foi embora. Eles vão voltar daqui a pouco. Meus pais. Eles vão perguntar por Samantha. Eles tem o direito de perguntar por ela, e eu tenho o dever de saber onde está ela. Mas eu não sei. Ela é tão pequena. Eu me sento no chão, esperando que o tempo passe, esperando que eles cheguem e comecem a me odiar. Esperando que alguém me diga que eu não sirvo nem ao menos pra cuidar de uma criança de oito anos. Eu espero e tenho esperança. Esperança que ela apareça na porta dizendo que tudo foi uma brincadeira. Esperança que meus pais me consolem e digam que vão acha-la. Esperança que eles a achem e que amanha eu possa ir com ela ate a escola, e no caminho ir puxando o cabelo dela e reclamando que ela me atrapalha a vida. Como todos os dias. Ela não me atrapalha a vida. A vida é que me atrapalha. Samantha é que me da sentido na vida. Eu sei que ela é só minha irmã mais nova e que toda irmã mais nova merece ser destratada, mas no fundo eu sei que é ela que me mantém bem. Meus pais são distantes comigo quando ela não está perto. Eles não gostam de mim, eu sei. Eu não digo que não me amem. Pais sempre amam os filhos. Mas eles não gostam de mim. Ninguém é obrigado a gostar de ninguém. Eu aceito isso, mas é gostoso fazer de conta que eles gostam, quando Samantha está por perto. Eu queria gritar o nome dela, mas não consigo então repito o nome dela. Samantha, Samantha, Samantha. Mas depois de repetir o nome dela muitas e muitas vezes ele começa a perder o sentido, e já não consigo associar o nome dela a ela. Mas eu não consigo pensar em mais nada. Não consigo chorar. Eu queria chorar, eu queria gritar o nome dela. Eu queria chamar minha mãe e chorar no colo dela. Era só isso que eu queria agora. Ser fraco, chorar, gritar, morrer... Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxx xxxx Cena 3 - Samantha Já estou cansada. Com sono. Mas se tudo é um pesadelo eu não devia ter sono. Tenho vontade de chorar, mas eu não vou. Fox não choraria. Ele nunca chora, diz que é coisa de menininhas medrosas. Eu não sou medrosa. Mas estou com medo.... Se ao menos houvesse alguém aqui. Ate o Jay ia ser bem vindo. Ele se acha o mais inteligente e forte de toda a escola, mas não passa de um bobo. Mesmo assim eu queria que ele estivesse aqui. Qualquer pessoa. Ou pelo menos que a luz estivesse acesa. Uma frestinha de luz já seria ótimo. Talvez seja muito tarde e não tenha lua. Mas e as luzes da rua? Mas e que rua??? Eu não sei nem se estou em algum lugar. Eu devo estar no meio do nada. Em lugar nenhum. No espaço. Mas não vejo estrelas, não vejo nada. Meus olhos já não me servem aqui. E não é só isso, todos os meus sentidos parecem inúteis. Minha professora ia ficar contente em saber que eu me lembro quais são os cinco sentidos, mas acho que ela não ia entender se soubesse que todos são inúteis. Sou cega, não ouço, não sinto odores, minha boca está seca, e não sinto meu próprio corpo. Quando me deito no travesseiro sinto a maciez dos lençóis, o perfume dos meus cabelos recém lavados, vejo a luz dançando na parede quando pela janela, sinto o gosto da pasta de dente na minha boca e ouço minha mãe me dizendo boa noite. Mas aqui não sinto nada disso. Eu tento chorar, não me importando com o que Fox poderia pensar. Mas não consigo. As lagrimas estão presas em algum lugar dentro de mim. Eu soluço forte, mas nem isso me consola. -Deus!!! Deus devia me ouvir. Ele não deveria me deixar aqui em lugar nenhum. Jennifer me disse que Deus está em todo lugar. Então eu perguntei a ela se Deus ia pra um lugar vazio, onde não houvesse nada. Ela disse que sim, que Deus preenchia todos os espaços, que Deus não deixava nenhum lugar ser deserto e sem vida. Mas aqui não há nada. Onde está Deus?? Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxx xxxx Cena 4 - Fox Não sei quanto tempo já se passou desde que ela sumiu. Eu acho que perdi a noção do tempo ou então o tempo foi embora junto com ela. Deve ter sido isso. Pra que Deus iria querer que eu usasse o tempo se eu não sirvo pra nada?? Eu não mereço o tempo. Eu não mereço a luz. A casa está escura. Só agora eu percebo. A televisão estava ligada antes. Mas agora não há nada. Nem uma luz na janela. A escuridão é total. E o silencio é terrível. Acho que deve ser assim com um barco perdido no mar. O silencio total, e a escuridão. Um vazio imenso e o desconhecido tão perto. Mas ate os barcos perdidos tem direito a um farol. Eu não tenho um farol. Eu não tenho nada que me guie na escuridão da minha própria casa. Eu não tenho nada que me guie em direção a Samantha. Eu estou aqui perdido na minha própria casa, sem saber o que dizer aos meus próprios pais, sem saber o que dizer a mim mesmo. Eu não sei se me consolo dizendo que ela vai voltar ou se me obrigo a levantar e procurar por ela. A única coisa que tenho certeza de dizer a mim mesmo é que está muito escuro e que não há farol que me guie. Eu queria dormir e sonhar. Quem sabe com os sonhos eu acabe com essa tristeza. Se morrer é dormir então eu queria morrer. E sonhar. Mas quais seriam meus sonhos caso eu morresse? Que sonhos vem do sono da morte? Melhor não saber. Melhor não dormir nem morrer. Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxx xxxx Cena 5 - Samantha Eu não sinto mais nada. Não sinto dor nem desespero. Não choro, não grito, nem me lamento mais. Não sinto frio. Continuo não ouvindo, vendo, sentindo, nada. Mas não sofro. Meus pensamentos estão mais simples agora. Eu não me preocupo mais com nada. Tudo é mais prático. Não há mais importância onde estou, onde estava, quem eu era. Já não me importa mais o que deixei para trás. O que importa agora é somente o vazio. O vazio já sou eu. Se isso é estar morta eu preferia viver pra sempre. Eu queria sofrer. Eu tento chorar novamente. Mas não tenho mais motivos. Não sinto mais nada. Só tenho vontade de me desfazer, de desaparecer, de ser nada. Eu não penso assim com tristeza, mas somente com a certeza de que é assim que deve ser. Quero somente passar por esta fase, deixar a luz para trás, deixar o perfume do meu shampoo pra trás, a voz da minha mãe, o amor do meu irmão, o carinho do meu pai. Esquecer o gosto do chocolate quente de manha. Deixar pra trás a sensação gostosa do vento frio em um dia quente. Esquecer o cheirinho bom de filhote de cachorrinho. Esquecer e não sofrer. Parece ser o melhor. Olhar somente pra frente. Sem nem ao menos saber o que existe em frente. Ou desaparecer. Mas eu não posso escolher. Só posso esperar. Eu vou esperar, afinal não tenho nada melhor a fazer. Eu não tenho mais passado, nem lembranças. Só tenho o futuro. E algo me diz que a melhor maneira fazer o futuro e trata-lo como passado. E assim vai ser. Vou ficar aqui, no nada, lembrando o meu futuro, lembrando o dia que eu encontrei meu irmão de novo. O dia que eu vi a luz de novo, o sol, as estrelas. O dia que meus cinco sentidos foram acordados. -Fox, estou esperando por você. Eu só confio em você. Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxx xxxx Cena 6 - Fox Um barulho na porta. Minha mãe rindo baixinho. Eles entram em casa. Eu vejo eles entrando. Eu preciso congelar esse momento, mas o tempo vai passar depressa, eu sei. Eu queria que o tempo parasse, só agora. Que os dois estivessem na porta ainda sorrindo, sem saber o que tinha acontecido. Mas o tempo não faz gentilezas. Ele nasceu pra passar e rápido, ainda mais quando você reza pra ele não acelerar tanto. Eu respiro fundo e me preparo. Me preparo para o primeiro minuto do resto da minha vida. Eu sei que tenho que respirar bem fundo mesmo, tentar com uma bocada de ar pegar toda a energia do mundo. Meu coração bate cada vez mais forte, minha cabeça dói, minha boca está seca, não consigo me levantar do chão. O tempo parou só pra mim. Eles continuam andando, entrando em casa, rindo e falando sobre a noite tranqüila que tiveram. Mas o maldito tempo não é tão generoso comigo. Ele passa veloz. Ate que acontece. Eu olho os dois nos olhos e vejo a decepção, e a raiva. Que ironia, o tempo que não queria parar, agora resolveu congelar. E congela tudo em volta a ele. Eu esqueço tudo nesse momento. Eu não consigo me lembrar de ontem, de antes de ontem, do natal passado. Consigo somente ver o futuro. E ele é tão claro, cristalino. Ao mesmo tempo ele é negro. Eu me vejo sozinho, sem uma luz que me guie, sem uma voz doce que me acalme, sem uma palavra de carinho, sem um olhar de compreensão. Sinto somente um frio intenso. O frio que, sinto, ira me acompanhar para sempre. A não ser que eu encontre Samantha. Eu preciso encontrar ela. Ela levou toda a luz, todo o calor. Ela me deixou aqui, sozinho, despreparado para agir com essas pessoas que somente ela conhecia. O tempo agora resolveu ser meu amigo, ou terá sido minha mente que resolveu ir embora e deixar meu corpo descansar? Eu me deito na minha cama e olho pra janela. O céu está claro e as estrelas estão brilhando como nunca. O mundo continua girando, e amanha o sol vai nascer de novo. Milhões de pessoas vão continuar vivendo como sempre, morrendo e nascendo. Ate mesmo meus pais vão voltar a rotina, cedo ou tarde. Mas pra mim e Samantha não existe presente. Somente futuro. Fim....